Kokinirê é um homem de 35 anos da etnia Gavião. Vive em uma aldeia dentro de uma reserva perto da cidade de Marabá, no Pará. Pai de uma menina de 13 anos, Kokinirê é estudante do curso de Artes Visuais na Universidade Federal do sul e do Sudeste do Pará (UNIFESSPA) e comunicador.

Presente pela segunda vez no Acampamento Terra Livre (ATL), promovido por lideranças indígenas de todo o país, Kokinirê - cujo apelido é Madson - conversou com o Reconta Aí sobre a importância do encontro, que está na sua 18º edição.

Reconta Aí - Como é a experiência de participar de um evento que reúne indígenas de todo o Brasil, como o Acampamento Terra Livre?

Kokinirê - É muito prazeroso ver essa diversidade e esse monte de povos indígenas juntos, lutando pela mesma causa: em busca dos nossos direitos. E com o objetivo principal de proteger o meio ambiente para a próxima geração. É muito gratificante e eu chego a ficar emocionado de fazer parte disso.

Como eu trabalho com comunicação e levo informações para as nossas bases indígenas, ver essa união dos povos é muito importante. Meu objetivo é absorver para poder transmitir para as nossas bases.

Reconta Aí - É a primeira vez que você vem ao ATL?

Kokinirê - É a segunda vez que venho ao ATL e em cada acampamento é uma emoção diferente. A primeira experiência que tive foi bastante emocionante, mas neste ano eu vejo que as coisas estão acontecendo e a nosso favor principalmente. Não sei se é porque é um ano eleitoral.

Reconta Aí - Este ano, há diversas votações e julgamentos sobre leis ambientais e fundiárias que afetam os indígenas. Você tem levado essas informações para sua aldeia e também às próximas?

Kokinirê - Sim, eu tenho feito esse trabalho para todo o estado do Pará pela Federação dos Povos Indígenas do Pará (FEPIPA). Lógico que temos outros meios, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), que fazem o mesmo trabalho. Tentamos passar o que está acontecendo e o nosso objetivo é fazer com que as informções cheguem de forma bem clara com fotografias, textos e vídeos.

Reconta Aí - Como é a questão do acesso à internet nas aldeias?

Kokinirê - Na nossa Reserva temos internet via rádio. São 19 aldeias e cada aldeia tem o seu sistema de internet independente.

Reconta Aí - Como é feita a comunicação?

Kokinirê - Utilizamos o Instagram @fepipa_oficial e o Twitter @fepipa_oficial. E além das informações que vêm de todo o Brasil, buscamos entrevistar pessoas, verificar a visão de diferentes parentes - forma como os indígenas se referere a todos os indígenas do Brasil - compreender e conversar com outras regiões para saber se vivem as mesmas situações que nós.

Reconta Aí - E as vivências são parecidas?

Kokinirê - De tudo o que a gente pode observar, conversando com outros parentes, vimos que vivemos a mesma situação. Mesmo que as coisas aconteçam distantes umas das outras, as coisas são as mesmas, a discriminação, a falta de respeito.. A questão de tirar direitos conquistados acontece em todo o Brasil, com todos os povos indígenas. Então a gente se focou nisso, passar essa realidade para as pessoas até porque existem brancos que também acessam nossas páginas.

Escrevemos em português porque cada povo tem a sua própria cultura e língua, então temos os que falam idiomas Tupi-Guarani, os que falam idiomas do Macro-Jê, Kaiapó, Xicrim e a gente entende só poucas palavras. É bem diverso por isso usamos o português.

Reconta Aí - Você vê a eleição como uma esperança?

Kokinirê - O Lula foi um presidente que criou leis que ajudaram a gente. Fez também coisas que nós não concordamos, tipo barragens, porque afetam diretamente nossas comunidades. Mas há certas coisas, como a criação das cotas indígenas, a abertura de diversos Institutos Federais e de Universidades que foram boas.

Os indígenas têm uma educação diferente dos brancos. Temos dificuldades em relação à fala e ao entendimento de certas coisas porque falamos nossa língua e português, e nas universidades e escolas são usadas palavras técnicas em português que ainda não conhecemos. Existe essa dificuldade de comunicação e as cotas são boas para nivelar isso.

Reconta Aí - Você cursou o ensino superior?

Kokinirê - Eu faço Artes Visuais na Unifespa em Marabá, contemplado por essa política de cotas. Temos o apoio dos univesitários ao pedir a revisão do valor e da concessão da Bolsa Permanência, que é ofertada para indígenas e quilombolas. Atualmente temos 106 alunos indígenas e quilombolas e apenas 28 bolsas. Esse governo está fazendo um estrago tanto na educação quanto nos direitos indígenas.

Reconta Aí - Por que as cotas são tão importantes?

Kokinirê - A gente viu que a educação, assim como a comunicação, é uma ferramenta muito importante para gente. Porque aí nós vamos fazer com que os brancos nos respeitem, mas não de forma agressiva ou física, mas intelectual. Precisamos dessas novas técnicas e aprendizados para nos defender.