Prêmio Proex de Audiovisual faz seu pré-lançamento na II Jornada de Ensino, Pesquisa e Extensão da Unifesspa
“Ararandeua” teve seu pré-lançamento na 2a Jornada de Ensino Pesquisa e Extensão da Unifesspa. O projeto de Camila Gusmão e Ricardo D’Almeida, estudantes da Unifesspa, sob supervisão do professor Jaxnildo Aragão, foi vencedor do Prêmio Proex de Arte e Cultura 2017 na linguagem audiovisual. O documentário trata das relações históricas entre as populações tradicionais da região de Rondon do Pará e o Rio Ararandeua, que banha o município, além de temas atuais como a descoberta de minério no subsolo do município e a chegada de um grande projeto de exploração de bauxita que promete mudar radicalmente o ritmo da cidade, trazendo uma nova onda “desenvolvimentista” com impactos sobre o rio.
Confira a entrevista com os idealizadores do filme em que eles dão detalhes sobre o processo de produção e sobre o que o Ararandeua representa para Rondon do Pará:
De onde veio a ideia do filme?
Ricardo: Inicialmente, era ideia de um livro de fotografia sobre o rio Ararandeua que se transformou num ideia de documentário. Basicamente, foi registrar o rio do início ao fim, da nascente até sua foz. O rio é o protagonista do filme e todas as outras pessoas, os atores sociais, são os que vivem ao redor dele, que dialogam como o rio de alguma forma são as pessoas que fornecem as memorais relacionadas à essa vivencia com o rio.
Camila e eu montamos o coletivo para concorrer ao Prêmio Proex para executar essa ideia. Ela foi a pessoa ideal para fazer essa parceria, sendo um projeto muito especial de construir, de colocar no papel, de fazer o projeto em si. E, quando fomos contemplados, foi uma alegria muito grande porque tem o peso da instituição por trás e também com o auxilio financeiro abre portas, abre possibilidade de você fazer um filme mais interessante, mais robusto, que as pessoas levem mais a sério.
Por que o Ararandeua?
Ricardo: Rondon do Pará é o único município que o Ararandeua corta. Rondon tem vários outros rios, mas a única cidade que ele banha é Rondon. Quer dizer, Rondon é uma cidade do Ararandeua.
O que o rio representa para essas pessoas?
Ricardo: As pessoas têm muita consciência de que, sem o rio, não haveria a presença deles na região. Ele fornece água, alimento aos animais, irriga a lavoura e etc. E o contraste disso é que, por mais que todo mundo saiba que sem essa água não teria condições de existir vida, o rio é muito sofrido, agredido, do começo ao fim. Na sua nascente, praticamente não há mata ciliar, é muito pouca. Até porque está acontecendo uma situação muito interessante: a nascente está subindo, está aumentando o rio. E isso tem gerado a preocupação de reflorestar essa área justamente para permitir que ele aumente.
Foi interessante descobrir também o Povo Amanayé na foz do Ararandeua, último quilômetro do rio. Eles não aparecem em nenhuma ferramenta que utilizamos para pesquisar sobre as ocupações no entorno. Aparece apenas os Gavião, o povo Kyikatêje, que foram expulsos da nascente e, hoje, ocupam uma área indígena em Mãe Maria, ação que retratamos no filme tanto sobre como ocorreu, como a relação que eles tinham com o rio.
E como é a relação desses povos com o Rio?
Ricardo: Os Kyikatêje contam no filme, por meio de pessoas que eram adolescentes no momento da expulsão, de como era o cotidiano naquela área e como ocorreu a separação da terra. Já os Amanayé, apesar de não termos encontrado nenhum registro deles na área, tem uma relação antiga com o Ararandeua. Esse povo passou por um processo de miscigenação bem forte com os quilombolas, remanescentes de escravos; é um o povo que tem na pele essa mistura das populações indígenas como o povo africano e isso também tá no filme. Essa terra dos Amanayé é fruto de um decreto de 1945 que o regulamentou. No entanto, segundo o cacique, hoje só tem 1/3 do original. É muito caótica a situação. Imagina todas essas dinâmicas de fazendeiro de um lado, fazendeiro de outro, os indígenas!
Existem muitos conflitos na área do Ararandeua?
Ricardo: Esses conflitos são entre fazendeiros, madeireiros, MST, indígenas, quilombolas; tanto pela ocupação das áreas como no interesse e expectativa pela expansão da nascente do rio, principalmente pelos donos de fazenda que querem que o rio chegue nas terras deles. pra valorizar a terra, ter água pra beber, essas coisas.
Como foi o processo de produção do filme?
Camila: No roteiro do filme, a princípio, decidimos quem seriam as pessoas que entrevistaríamos, a partir das pesquisas que fizemos antes de ir até o rio. Escolhemos algumas pessoas, as pessoas antigas de Rondon, as que presenciaram a abertura da PA-70 e para retratar como é que Rondon foi construída, afinal é a única cidade que o rio banha. Mas, quando saímos pra ir à foz do rio, encontramos essa aldeia Amanayé, que não estava no roteiro porque não sabíamos que existia. Inclusive, eles se denominam como Ararandeua, em alusão ao rio. Foram algumas surpresa que encontramos no meio do caminho. Na nascente do rio, também encontramos um laticínio que não sabíamos que tinha. Outra surpresa! Tudo foi mudando no período de um ano que passamos colhendo material.
Ricardo: O processo de gravação foi, basicamente, com duas câmeras, gravador, nós mesmos operando os aparelhos, com as condições locais. A edição e roteiro ficou por minha conta. O mais doloroso é escolher o que vai e o que não vai ser exibido. São 25 minutos de filme, mas são horas e horas de gravação e que é um material que futuramente pode render outros projetos. O curta pode ser transformado num longa, por exemplo, e pode ser juntado a outros materiais. Na verdade, alguma dessa histórias daria um filme. Dá vontade de deixar o cara falando o tempo todo “vamos fazer um filme só dele”.
A computação gráfica, legendas, é de Rondon. E a trilha sonora, nós pensamos que quanto mais regional, melhor e pensamos em um músico de Rondon também, mas ele acabou mudando de cidade. Foi, então, que convidamos o Marlos Monteiro, de Belém. É uma das coisas mais legais do filme. Isso é o legal do Prêmio Proex: você consegue gerar um ciclo de produção cinematográfica. Consegue pagar por esses trabalhos.
Como fizeram pra chegar nas localidades? Como foi o acesso?
Camila: A nascente do Ararandeua é a 43km de Rondon. Fomos por uma estrada de chão com ajuda de quem já conhecia a área. Encontramos um a pessoa que sabia onde era, nas proximidades da vila do km 30 que nos levou lá na nascente. Na foz do rio, já tínhamos planos de fazer imagem lá porque ele o rio Ararandeua se encontra ao rio Surubiju e formam o rio Capim.
Qual é a sensação nesse pré-lançamento? Qual o orgulho do filme materializado?
Camila: É muito emocionante porque dá bastante trabalho pra fazer, é muita coisa. É muito gratificante ver essa ideia de fazer um documentário, de colocar as ideias em video e contar histórias muito importantes que vão servir pra que no futuro e agora, embasem outras pesquisas. Tem muita coisa importante, muito material a ser estudado e é uma forma de ajudar a academia, a sociedade, a comunidade mostrando a história do Ararandeua.
Ricardo: É uma satisfação muito grande porque é quando a gente tem a chance de transformar uma ideia em algo palpável que pode ser visto e de repente transformar uma realidade, mesmo sem pretensão. O audiovisual tem esse poder, o testemunho das pessoas tem o poder. Às vezes, as pessoas estão dando entrevista, mas pode ser que elas nunca tinham pesado nisso, e passam a refletir sobre esse problema. Por exemplo, a expansão da nascente dá a cada um uma resposta porque é um mistério. Inclusive, ficamos num dilema de entrevistar ou não um especialista. acabamos deixando só as pessoas explicarem.
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