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Ineditismo na Unifesspa: índio Kayapó defende Trabalho de Conclusão de Curso em língua indígena mēbêngôkre

Publicado: Quarta, 28 de Agosto de 2019, 09h12 | Última atualização em Quarta, 28 de Agosto de 2019, 09h12 | Acessos: 3501

Veículo: Hiroshi Bogéa

Data: 27 de agosto de 2019

Link da Matéria: https://www.hiroshibogea.com.br/ineditismo-na-unifesspa-indio-kayapo-defende-trabalho-de-conclusao-de-curso-em-lingua-indigena-mebengokre/

Indio 1

Pela primeira vez um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) é defendido em língua indígena na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).

O ineditismo parte do aluno do curso de licenciatura plena em Educação do Campo (Fecampo) Bep Punu Kayapó (foto) que trouxe o seu trabalho acadêmico de 50 páginas intitulado: “Be Jakam Bet Djá Gu Me Arym Ba Arym Kaben o Ba Bit Noro Ket” que traduzido significa – “Se nós escrevemos a nossa língua a gente não se esquece”.

A defesa do TCC foi realizada na tarde dessa segunda-feira (26), na Sala 08 da Unidade I e contou com a presença de dezenas de pessoas, inclusive parentes do próprio aluno que vieram prestigiá-lo nesse momento tão importante.

A banca foi composta pela Profa. Dra. Maria Cristina Macedo Alencar e a Banca Examinadora foi composta pelo professor de História do Instituto de Estudos do Trópico Úmido (IETU) – Laércio Sena, da Faculdade de Educação do Campo – Lucivaldo Silva da Costa e do professor de Língua Portuguesa e especialista na língua mēbêngôkre – Eketi Kayapó.

O aluno Bep Punu Kayapó teve o tempo regimental de 15min para apresentação e defesa de seu trabalho e relatou as dificuldades que teve ao longo do tempo em que se dedicou a escrita do seu TCC em sua língua materna.

“Senti muita dificuldade para fazer esse trabalho porque em nossa terra indígena somos mais estimulados à oralização do que a escrita e encontrei poucos materiais para embasar a escrita do meu trabalho. Foi exigido de mim muito esforço, mas eu consegui”, disse entusiasmado o aluno.

O trabalho procurou refletir sobre os letramentos dos povos Mēbêngôkre a partir da observação nas escolas desse povo na Terra Indígena Mēbêngôkre Kayapó. O objetivo do aluno foi mostrar para o povo Mēbêngôkre a importância de se escrever na escola na própria língua.

Segundo Bep Punu Kayapó, as informações que ele escreveu foram adquiridas nos estágios de observação durante a formação do curso de licenciatura em Educação do Campo e estágio de intervenção.

Nesses estágios, o aluno observou que o povo Mēbêngôkre fala muito bem a sua língua, mas poucos sabem escrever em mēbêngôkre.

E concluiu que se o povo Mēbêngôkre aprender a escrever em sua língua materna poderão construir e escrever sua própria história.

Ele relatou que a cultura dos povos Mēbêngôkre tem suas raízes fortes em manter a valorização das tradições, e, principalmente, a língua falada em mēbêngôkre. Bep Punu Kayapó faz uma proposta pedagógica em seu trabalho para o ensino da língua nas escolas mēbêngôkre, com o propósito de ajudar na melhoria da educação escolar indígena nas comunidades mēbêngôkre.

“Pela primeira vez alguém da nossa família, da nossa aldeia consegue ir tão longe nos estudos. Para nós é um orgulho muito grande. Viajei pela madrugada para estar aqui. Estava ansioso para testemunhar esse momento. Quero pedir ao meu sobrinho que continue estudando para mostrar aos outros da nossa terra indígena que é possível chegar lá, que é possível adquirir conhecimentos e vencer”, disse emocionado Eketi Kayapó da Aldeia Indígena Kaprankrere, de Pau D’arco – PA.

O professor do Ietu Laércio Sena parabenizou Bep Punu Kayapó pela fala, exposição e pesquisa. “Ele está aqui para mostrar que os povos indígenas são capazes de produzir conhecimento e conhecimento científico. Tenho muito a agradecê-lo e espero que este trabalho seja o primeiro de muitos e que a Unifesspa permaneça cheia de parentes dialogando com a academia e produzindo ainda mais conhecimentos”, destacou.

“Não sei dizer se ele ou nós da banca estamos mais nervosos. Bep está enfrentando outro sistema de ensino, outra língua e ele está aqui rompendo com as próprias estruturas da universidade. Se há estudantes indígenas na Unifesspa por que não escrever o trabalho na língua deles? Escrever um TCC na língua indígena mostra o quanto a universidade é diversa, plural. Com esse trabalho, percebemos o quanto é importante termos materiais didáticos, paradidáticos na língua indígena – até para ela não desaparecer. Parabenizo o aluno por sua coragem e determinação e por chegar até aqui nos dando a lição de que os indígenas são tão capazes quanto nós de produzir ciência. Estou muito feliz por fazer parte desse momento”, pontuou o professor Lucivaldo da Silva Costa.

A orientadora de Bep Punu Kayapó disse que estava muito agradecida por ele tê-la escolhido como sua orientadora e pela dedicação em seu trabalho de conclusão de curso.

“Muitas vezes é negado a eles o direito de produzir ciência na sua própria língua, mas a Unifesspa cumpre seu papel com o desenvolvimento regional quando contribui para que se produza material como esse que servirá de fonte de pesquisa para professores, antropólogos, historiadores e, principalmente linguistas e, isso, é fantástico. Quero parabenizar o Bep porque ele teve a coragem de ir adiante e aceitou o desafio de escrever o TCC na sua língua materna e nosso diálogo intercultural foi tão rico para mim quanto foi para ele. A Fecampo está sendo pioneira autorizando seus alunos a escreverem seus trabalhos acadêmicos em suas próprias línguas. Com este TCC todos ganham, principalmente a sociedade do sul e sudeste do Pará”, concluiu agradecida.

As pessoas que vieram prestigiar a defesa do aluno Bep Punu Kayapó ficaram do lado de fora da sala aguardando ansiosos o resultado da nota. Enquanto isso, a banca se reuniu para avaliar o trabalho do aluno e, por fim, Bep Punu Kayapó foi aprovado com conceito excelente pela Unifesspa.

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